“Se as vozes não voltam não se escreve este livro e o que é este livro senão pessoas tentando abrir a porta” (Comissão das Lágrimas, p. 52)
“Se for mulher, metes-lhe Cristina” (p. 86), dizia a Simone o Senhor Figueiredo, “dono da fábrica, da modista, do escritório” (p. 51), na realidade dono do cabaret. “Simone, apesar de chamar-se Alice” (p. 19), mãe de Cristina, “viera de barco para dançar num teatro e não era teatro que lhe chamavam” (p. 12). O pai putativo (“diz-se que o patrão pai da filha, diz-se que o marido padre”, p. 90), preto (sempre este epíteto – estigma e farpa), “foi padre, não era padre já” (p. 12). O avô cego que “tacteia o mundo (…) convencido que as mãos, ao moldarem o ar, fabricam parentes” (p. 50) e o tio que “separa o corpo” da sobrinha, com a advertência “Nem pio” (p. 89). São estas algumas das vozes que povoam esta narrativa nos limites do caótico, em que Cristina, narradora privilegiada, retornada de uma Angola a viver os atribulados anos pós-independência e internada numa clínica de Lisboa, segrega um discurso delirante, deixando a cada passo que outras vozes o assumam.
AS VOZES
O sentimento que domina o leitor de Comissão das Lágrimas é o da dispersão, para o que contribui poderosamente esta multiplicidade de vozes emissoras do discurso. Por vezes, elas cruzam-se, como acontece no excerto seguinte, despistando o leitor por instantes:
[Cristina:
―]“e como repousar com as danças à noite e os dias a fugir das espingardas da tropa nas ruas de Luanda, o meu pai não se sabia onde, chegava a casa, com meia dúzia de pretos, arrependido de ter vindo, a minha mulher que não era minha mulher, a minha filha que não era minha filha” (p. 131/132)
Aliás, numa intrusão irónica e mal camuflada do autor no discurso do seu narrador, confessa-se:
“uma matilha de mabecos a trote, à espera de um fio de cheiro que os guie, desenterrando os mortos, se a caça escasseia, conforme desenterro defuntos que pilho à minha mãe e ao meu pai porque não sei qual de nós três fala agora” (p. 187)
Este procedimento, que consiste, no fundo, em fazer confluir e mesmo colidir o acto da enunciação com a própria história, assume neste livro uma certa relevância. Veja-se, por exemplo, esta outra intromissão, que chega a lembrar-nos a escrita de Saramago (referência que talvez não seja do agrado de ALA …):
“no momento em que a mola se libertava de um espigão invisível e recomeçava a distender-se tal como este capítulo, até aqui resistindo-me” (p. 297)
Para além disso, a insistência com que esta instância enunciadora é chamada à colação acaba por instituir um nível de auto-referencialidade notório, sem contudo atingir o grau de saturação que atingiu, por exemplo, em Livro de José Luís Peixoto:
“Se as vozes não voltam não se escreve este livro” (p. 49),
“que penoso dizer isto, dá a impressão de ser fácil e como a caneta demora, as vozes principiam a rarear” (p. 131),
“e a somar na mesma dificuldade com que escrevo sem dar conta que escrevo” (p. 149),
“decidi que este livro vai acabar dentro em pouco” (p. 201),
“onde decidi que este livro termina” (p. 207),
“quem escreve isto por mim” (p. 297),
além do passo em epígrafe do artigo.
A SINTAXE
Em Comissão das Lágrimas, ALA reincide no uso de uma sintaxe frouxa e desviante. De vez em quando, um período mais solidamente articulado proporciona ao leitor como que uma trégua na balbúrdia reinante. Um breve e imperfeitíssimo inventário, permite-nos identificar dois procedimentos típicos desta escrita atormentada:
Omissão frequente de verbos, desde os verbos declarativos, na passagem ao discurso directo,
“― A trabalheira que me dás rapariga
E contente, no caso de eu [lhe dizer]
― A trabalheira que lhe dou senhor?” (p. 26),
até aos verbos predicativos, e outros, facilmente supríveis pelo contexto:
“no apartamento de Lisboa vê-se o Tejo da marquise na condição de abrir o trinco porque os vidros [são]opacos” (p. 13);
“mas se me afastasse perguntava às névoas que o cercavam, na esperança de [haver]parentes ali, um afilhado, um sobrinho, o tio das perdizes” (p. 26)
Cortes sintagmáticos abruptos com justaposição de elementos díspares
“e não conhecemos vocês nem os, e as palmeiras mais fortes, nem os vimos, senhor, como as palmeiras me emudeceram, a mulata colares de cobre, pulseiras, carezas de branca rica que se tornaram farrapos (…) (p. 245)
Estas supressões e interrupções tendem a conferir ao discurso um débito sincopado e desconexo – sugestão eficaz da perturbação mental da narradora.
Casualmente, períodos como os que seguem vêm adoçar o caos relativo com alguma poesia ou um pensamento que refulge:
“e se calhar nenhuma filha com eles, inventaram-na, há quem invente filhas e passeie uma ausência ao colo até que um choro que mais ninguém escuta se cale e possam deitá-la, adormecida, no berço, afastando-se sem ruído de um nada que os alegra (…)” (p. 104);
“a vida, por mais que os meses mudem, não passa de um hoje sem fim” (p. 163),
“o problema não é morrer, é não termos vivido, nada estremece em nós com aqueles nomes, somente lágrimas fora do prazo que não pertencem a desgosto nenhum” (p. 269),
“o que os objectos exprimem se reparamos neles, perdem a sua inércia, recriminam-nos, exaltam-se, um minuto depois de direitos entortam-se de novo” (p. 283)
UMA NARRATIVA “CUBISTA”
“e o mundo, palmo a palmo, de volta, os tiros cessavam e mais travessas, mais becos, mais musseques, tapumes derrubados onde soluçavam frangos, uma cabra flutuando ao acaso ou o badalo somente, suspenso de nenhuma papada, a caminhar por ali, pessoas ocultas numa dobra de prédio, não fazendo parte do escuro, fazendo parte das casas, cada vez menos pés, menos braços, menos carne, tijolos em que lábios, tornados paredes, respiravam ainda seguindo-o com olhos de caliça que apesar de cegos o viam”
Ao ler-se o parágrafo que precede, como não recordar o quadro “Guernica”, de Picasso? Num e noutro, o mesmo horror da guerra, animais e gente subitamente irmanados no sofrimento, corpos destroçados, objectos como que investidos de vida (“tijolos em que lábios, tornados paredes, respiravam ainda”).
Mas, apesar da sua intensidade, creio que esta sugestão é um dado subjectivo e meramente impressionista. Se este romance suscita o epíteto de cubista é sobretudo pela fragmentaridade das ideias e por um certo simultaneísmo, entendido como ocorrência simultânea de várias vozes. Outrossim, a recusa da tese mimética é uma evidência, tanto na pintura cubista como nesta narrativa, e, quanto à noção de perspectiva, se o cubismo pictórico a rejeita, o romance de ALA não me parece favorecê-la, na medida em que o foco narrativo é sempre assumido por personagens tão atormentadas que lhes é impossível um distanciamento objectivador/perspectivador.
Até a técnica da colagem, que o cubismo incorporou no início do século XX, parece estar aqui documentada na utilização sucessiva de memórias avulsas e heteróclitas:
“é quando apenas o gato emerge do soalho a procurar-nos, não em Luanda, aqui, o mesmo gato, juro, o meu avô terra ou antes cordas que o desciam e eu junto à camioneta a fitá-lo, a minha mãe de súbito Alice de novo, não Simone, não vão matá-lo, pai, não tenha medo, todos esqueceram as pessoas de pulsos amarrados na praia menos nós, uns dias de licença na condição de tomar os comprimidos contra as manhãs difíceis, ruínas poeirentas, fragmentos miúdos, eu nos braços de uma mulher mas qual porque dúzias de vizinhas que os militares levaram […].” (p. 27)
José Gil, citado por José Mário Silva, no seu excelente artigo “Vozes sobre vozes” (Expresso, suplemento Actual nº 2033, 15/10/2011), corrobora a minha anterior observação, referindo-se embora a outro romance de ALA:
“Não uma narrativa, nem linear nem descontínua. Mas uma imensa colagem de imagens, de cenas, (…) recordações não de um só mas de múltiplos tempos cronológicos.”
Em conclusão, e ainda a propósito da dificuldade em identificar, por vezes, as vozes cruzadas nesta narrativa, uma recordação com muitos anos. Na aula de Português, um colega, de pé, junto da secretária onde se sentava a Dr.ª Fernanda Medeiros, professora da disciplina, no Liceu Normal D. Manuel II, lia a tirada de Telmo Pais na cena IV do acto III do Frei Luís de Sousa:
― “Meu Deus, meu Deus! (ajoelha) levai o velho que já não presta para nada, levai-o, por quem sois!”
― Quem é o velho, Fulano?
E o colega, imediatamente:
― É o romeiro.
― Ó menino, então o Telmo ia pedir a Deus que levasse alguém que não fosse ele mesmo?! Achavas isso bem?
Como reagiria a pobre da professora, que amiúde se queixava da desgraça da turma, perante as dificuldades suscitadas pela leitura de A Comissão das Lágrimas? Estou mesmo a vê-la fulminar-nos com aquele anátema que mais de uma vez lhe ouvi, sob a forma de predição:
― Se, algum dia, um de vocês conseguir tirar um curso superior, que me escreva. Vou ficar muito surpreendida…
Pensando melhor, imagino que, se ainda é viva, a senhora terá deixado de ler os romances de Lobo Antunes aí por volta do Manual dos Inquisidores. Aos últimos não reconheceria seguramente o estatuto de obras literárias, quanto mais obras de leitura obrigatória nos programas de ensino … E eu, que nunca cheguei a escrever-lhe, teria dificuldade em convencê-la. Até porque subscrevo sem ressalva estas palavras certeiras de António Guerreiro:
“ao impedir o leitor de compreender e seguir uma intriga, [ALA] retira-lhe algo que é uma necessidade imanente do romance e do qual ele não pode prescindir, entrando em falha. Dito de outro modo: o livro de António Lobo Antunes pressupõe uma história enquanto objecto de uma narração, exige do leitor que este saiba do que é que falam e de onde vêm as personagens, mas omite tudo isso, sem se importar com o facto de não assumir a responsabilidade da sua forma. Parece comprometido com o fragmentário e a dissolução das categorias narrativas, mas continua a exigir uma totalidade.” (“Quem falou em polifonia?”, Expresso, suplemento Actual nº 2033, 15/10/2011)
N.B. Não tendo tido a oportunidade de ler os excelentes artigos de José Mário Silva e de António Guerreiro no suplemento Actual do Expresso, foi em http://alawebpage.blogspot.com/ que a eles tive acesso.
É com alguma desconfiança que se avança na leitura deste livro de contos de Luís Sepúlveda, que parece, ao longo das primeiras páginas, padecer de alguma falta de fôlego narrativo. A badana da contracapa como que confirma aliás essa primeira impressão, com a informação de que “o presente livro reúne um conjunto de narrativas que se encontravam dispersas por edições há muito esgotadas ou que permaneciam inéditas nas gavetas do autor”. “Inéditas nas gavetas do autor” significa, provavelmente, escritos da juventude, que L. S., por qualquer razão, se resolveu a resgatar da inexistência, para um destino incerto.
Os contos estão repartidos por três séries ou secções (“Amores e desamores”, “Heróis e canalhas” e “Imprevistos”) a que se soma ainda um conto isolado, com o título “Uma outra porta do céu”. Ora, ao chegarmos ao primeiro conto da segunda secção, “Parou um carro a meio da noite”, ainda nos sentimos algo defraudados com o que nos parece ser a escassa perícia de um narrador excessivamente preocupado com a informação referencial a dar ao leitor, multiplicando deícticos e informantes:
“Parou um carro lá em baixo. Posso ver daqui as luzes que se reflectem no tecto (…)
“O carro está ali parado há uns minutos, mas as portas não se abrem. O automóvel permanece quieto junto do passeio, em frente da entrada deste edifício onde vivo ainda.” (p. 69)
Para mais, a somar à desagradável sensação de um narrador que não nos larga, que nos explica tudo, não vamos nós deixar escapar algo importante, a repetição de segmentos narrativos, com ligeiras variantes, insinua a impressão de que o autor recorre a tal expediente com fins de enchimento:
“Mas o automóvel continua lá em baixo e parece-me que estão a fumar lá dentro.” (p. 71)
“(…) mas as pancadas na porta continuam e eu não sei se estou calado ou estou a gritar que não está ninguém, que não cheguei, que se vão embora dali, que preciso de silêncio, de silêncio e tempo, porque há muito tempo que um carro parou lá em baixo e continua de luzes apagadas, e na rua não há ninguém que possa ver a sua cor preta e as luzinhas que se avistam lá dentro de cada vez que acendem cigarros, mas as pancadas na porta continuam (…).” (p. 75)
Só que, contrariamente ao que acontece em contos que antecedem este, aqui, a reiteração não é usada como simples procedimento estilístico ou como vulgar expediente expansivo. Pelo contrário, ela funciona como ingrediente essencial da diegese, criando no espaço narrativo a ilusão da angústia do acossado, prenúncio do suicídio.
A partir deste momento, ultrapassada a desconfiança inicial, o leitor reconcilia-se com o autor e com os sucessivos narradores de serviço e aceita a cumplicidade sem a qual não há magia (isto é, literatura) que resista. Aliás, a magia torna-se outro ingrediente essencial de contos como o do comboio Antofagasta-Oruro (“Mudar de rumo”), dado como perdido para sempre num banco de nevoeiro, com todos os seus passageiros, ou “Uma casa em Santiago”, casa esta cujo enigmático sumiço corta cerce a bela história de amor nascente com Isabel, no n.º 20 da calle Ricantén.
Conforme se diz em “Uma outra porta do céu”: “Onetti tem razão: é preciso renunciar aos territórios físicos e habitar o território da imaginação.” (p. 224).
Recebi, pela segunda ou terceira vez, um email edificante, que, por imperativo ético, transcrevo mais abaixo. De tão exacerbadamente moralizante, o texto em questão poderia ser vertido em linguagem bíblica, numa espécie de tábua dos 11 mandamentos:
1.º, não receberás pensão por morte de teu pai ou mãe funcionários públicos;
2.º, não cuidarás de arbustos em hospital público, se já houver jardineiros incumbidos de tal tarefa;
3.º, não te reformarás antes de sentires que o último sopro de vida se te esvai entre os lábios;
4.º, não aceitarás que te paguem mais do que 12 meses em cada ano civil, e assim sucessivamente
Este tipo de emails é muito útil para difundir a ideia de que o povo grego é o responsável pela crise de que, na verdade, os responsáveis são os dirigentes políticos corruptos, o poder económico e o poder financeiro. Não foram com certeza os trabalhadores gregos que fizeram as leis que permitiram os desaforos (alguns dos exemplos dados são-no, realmente) a que o email se refere. Em contrapartida, lá, como em Portugal, são os trabalhadores que acabam por pagar a irresponsabilidade criminosa dessa gente.
Pena que quem elabora este email não faça a destrinça entre os exemplos 4 e 6, entre outros. Porque é fácil compreender a quem é que interessa vender mercadorias a preços exorbitantes, assim como é fácil entender que vale mais receber 12 meses por ano a 1000€ por mês do que 15 meses a 500€. Quando se desdenha dos Gregos por receberem o 15.º mês, está-se a enviar aos trabalhadores portugueses a seguinte mensagem: aceitem sem protestar que vos retirem o 13.º e o 14.º meses; não queiram ser como os malandros dos Gregos que, por causa dessas regalias, estão agora no estado que sabemos. Mensagem esta que é extremamente útil… ao governo que nos vai espoliar desses direitos adquiridos cuja lógica... levou os Gregos “até à demência, até à falta de vergonha”, como se diz no Jornal Económico.
Diz-se que a Grécia gasta muito dinheiro em equipamento militar, omitindo-se que a Alemanha e a França condicionaram a concessão de empréstimos à Grécia à compra de submarinos e fragatas produzidos por aquelas duas potências, actuais donas da Europa. Está-se mesmo a ver que os submarinos e as fragatas são indispensáveis para a Grécia ultrapassar a crise e que, com esta venda, a dupla franco-alemã está a dar uma valiosa ajuda aos Gregos, que não se sabem governar.
Também o exemplo das reformas aos 50 e 55 anos, respectivamente para mulheres e homens, veicula uma mensagem que é um óptimo adjuvante da acção dos governos europeus empenhados em destruir décadas de conquistas civilizacionais dos trabalhadores e em prolongar as carreiras contributivas até aos 67, 68 anos. Não se celebra o facto de os progressos científicos e tecnológicos permitirem hoje que se trabalhe muito menos do que no passado e que, após 35 ou mesmo 30 anos de trabalho, se usufrua de um período de vida em que é ainda possível concretizar projectos que as obrigações profissionais impediam. Não. Pelos vistos, o que é mesmo sério é trabalhar enquanto a morte não sobrevém.
Muito estranhamente, mas deve ter sido lapso involuntário do autor destes 11 mandamentos, não há nenhuma referência aos lucros das grandes empresas gregas, nem aos salários, pensões e mordomias dos respectivos gestores e administradores executivos e não executivos, nem às grandes fortunas. Decididamente, na Grécia, são os funcionários públicos – jardineiros, motoristas e reformados – os grandes responsáveis pela crise. Que coincidência! Em Portugal, também é assim!
TEXTO DO EMAIL
GRÉCIA: é difícil acreditar Bom, acho que a Europa devia ter namorado com mais atenção antes de ter casado com a Grécia, principalmente pela fama que ela tinha.
Agora, se é para manter o casamento, tem de aguentar, pagar e impor economias.
Retirado do fórum do Jornal Económico - 29/06/2011
Lê-se, por vezes, que os Gregos, coitadinhos, são um pobre povo periférico que está a sofrer as agruras de uma crise internacional aumentada às mãos da pérfida Merkel.
Já é tempo de sair desta superficialidade, de perceber que os Gregos têm culpas no cartório, que não foram sérios e que não o estão a ser. Os Gregos levaram a lógica dos "direitos adquiridos" até à demência, até à falta de vergonha. Contam-se factos inauditos. Os exemplos desta falta de seriedade são imensos, a saber :
1 - Em 1930, um lago na Grécia secou, mas o Estado Social grego mantém o Instituto para a Protecção do Lago Kopais, que, embora tenha secado em 1930, ainda tem, em 2011, dezenas de funcionários dedicados à sua conservação.
2 - Na Grécia, as filhas solteiras dos funcionários públicos têm direito a uma pensão vitalícia, após a morte do mãe/pai-funcionário público. Recebem 1000 euros mensais - para toda a vida - só pelo facto de serem filhas de funcionários públicos falecidos. Há 40 mil mulheres neste registo que custam ao erário publico 550 milhões de euros por ano. Depois de um ano de caos, o governo grego ainda não acabou com isto completamente. O que pretende é dar este subsidio só até fazerem 18 anos...
3 - Num hospital público, existe um jardim com quatro (4) arbustos. Ora, para cuidar desses arbustos o hospital contratou quarenta e cinco (45) jardineiros.
4 - Num acto de gestão muito "social" (para com o fornecedor), os hospitais gregos compram pace-makers quatrocentas vezes (400) mais caros do que aqueles que são adquiridos no SNS britânico.
5 - Existem seiscentas (600) profissões que podem pedir a reforma aos 50 anos (mulheres) e aos 55 (homens). Porquê ? Porque adquiriram estatuto de profissões de alto desgaste. Dentro deste rol, temos cabeleireiras, apresentadores de TV, músicos de instrumentos de sopro ...
6 - Pagava-se 15º mês a toda a classe trabalhadora.
7 - As Pensões de Reforma de 4.500 funcionários, no montante de 16 milhões euros por ano, continuavam a ser depositadas, mesmo depois dos idosos falecerem, porque os familiares não davam baixa e não devia haver meios de se averiguar a inexactidão dessa atribuição.
8 - Chegava-se ao ponto de só se pagarem os prémios de alguns seguros quando fosse preciso usufruir deles !
9 - A Grécia é o País da União Europeia que mais gasta, em termos militares, em relação ao PIB (dados de 2009). O triplo de Portugal !
10 - Há viaturas oficiais da administração do Estado que têm 50 condutores. Cada novo nomeado para um cargo nomeia três ou quatro condutores da sua confiança, mas como não são permitidos despedimentos na função pública os anteriores vão mantendo o salário.
11 - Em, 27/06 último, o Prof.Marcelo, acrescentou mais uma à lista. Afirmou ele: " Na Grécia, cerca de 90% da terra não tem cadastro. Agora digo eu: sabem o que significa isso? Significa que os proprietários não pagam impostos. Eu já tinha ouvido dizer que os gregos não pagavam impostos. Ora, a grande receita do Estado provém dos impostos. Isto quer dizer que o erário publico do Estado grego esta vazio, totalmente vazio. Quer dizer, os milhões da UE é que serviram, durante todos estes anos, para manter o nível de vida atingido dos gregos. Não admira que já tenham estoirado 115 mil milhões e agora precisem de mais 108 mil milhões.
Pasmei ao ouvir e ver, há pouco, num dos telejornais, o nosso bem-aventurado ministro dos estrangeiros, Paulo Portas, declarar, num castelhano aprimorado, que todas as autoridades portuguesas desejavam um pronto restabelecimento de Hugo Chávez. Agora, já só falta firmar um contrato com as autoridades cubanas para logo a seguir jurar, em Havana, que o governo português faz votos para que Fidel e Raul continuem inabaláveis como rochedos. Se o ridículo não mata, aparentemente a hipocrisia não é mais mortífera. Eu, que subscrevo, sem reserva mental nem antífrase, o anelo das “autoridades portuguesas”, espero que a Venezuela não venha nunca a conhecer o triste destino da Líbia, nem Chávez o de Kadhafi (o que muito agradaria ao Tio Sam). Se isso acontecesse e Portas mantivesse o seu múnus actual (uma desgraça nunca vem só), lá o teríamos a perorar na nossa própria televisão, lamentando cristãmente a morte de um ser humano, mas celebrando com os apaniguados do CNT local a submissão da Venezuela aos ditames do capital.
O ministro da Educação, Nuno Crato, anunciou recentemente a intenção de extinguir a disciplina de Tecnologias da Informação e da Comunicação no 9.º ano, considerando que, ao chegarem a esse nível de escolaridade, os alunos dominam já suficientemente os computadores, o que torna a disciplina supérflua, logo factor de desperdício. Creio que o ministro tem toda a razão e reputo de corporativas – por conseguinte, ilegítimas – as reacções dos professores desse grupo disciplinar. Eles que tratem de se reconverter, visto que qualquer miúdo de treze anos, e até menos, domina perfeitamente o seu pc (com minúsculas, para não confundir com o PC maiúsculo, muito mais difícil de dominar). Eu mesmo, que tenho mais de treze anos, é certo, mas apenas frequentei umas horitas de formação contínua sobre computação, sou perfeitamente capaz de processar texto no word (este texto prova-o), de realizar uma apresentação em power point, de navegar na internet e até de blogar como um grande.
O que me deixa algo confuso é que este simpático ministro, que faz com certeza suspirar magotes de professoras (ainda que provavelmente menos as ingratas que leccionam as TIC), e logo ele que tem um raciocínio tão matemático e que “disseca com rigor e impiedade os lugares-comuns em educação, mostra o vazio dos conceitos que têm dominado a pseudopedagogia do laxismo e da irresponsabilidade e explica a ideologia frouxa que está por detrás da linguagem mole e palavrosa a que se tem chamado eduquês”, logo ele, digo, não tenha, com o seu bisturi de gume afiado, promovido a dissecação do conjunto do currículo, levando o seu rigor e impiedade até ao lugar-comum da necessidade de disciplinas como o Português, a História, a Filosofia, as línguas estrangeiras e tantas outras. É que – e posso afirmá-lo com a autoridade de quem leccionou Português e Francês durante mais de trinta anos – qualquer aluno chega ao 1.º ciclo a falar muito razoavelmente o português, ao 2.º ciclo a escrevê-lo quase sem erros, sobretudo agora que foram suprimidas as consoantes mudas, ao 3.º a exprimir-se em inglês técnico quase tão bem quanto o engenheiro Sócrates e ao Secundário com a perfeita noção de que Marcello Caetano foi um grande empresário do ramo automóvel e de que António de Oliveira Salazar foi o primeiro Presidente da República do pós-25 de Abril.
Omito aqui o Francês, disciplina em que raramente chegam a dominar a conjugação do verbo avoir, o que, de todo, é irrelevante, pois o inglês supre perfeitamente qualquer necessidade de comunicação com alienígenas. Da Filosofia, bastará dizer que é uma disciplina que, como sabemos, nasceu do ócio, nas antigas colónias gregas da Ásia Menor. Está à vista o triste fim dos países que têm pensadores ociosos.
Em suma, senhor ministro, acabe com toda esta parafernália de disciplinas supérfluas e Portugal renascerá das cinzas. Como a Fénix.