Os Terraços de Junho, Urbano Tavares Rodrigues
Reencontrei Urbano Tavares Rodrigues, que não lia há muitos anos, nos Terraços de Junho, livro de “contos e sonhos” – assim o define o autor – recentemente publicado.
A sensualidade estuante, os temas políticos e sociais, a cultura da relação humana e, a outro nível, a elegância do estilo marcadamente metafórico aí estão a pontuar narrativas muito breves, que nessa brevidade contrastam com as que dele conhecia. Não só na brevidade, aliás. Da leitura do conjunto de contos que constituem a primeira parte do livro, resulta a impressão de alguma redundância na sua efabulação. Trata-se de curtas histórias nas quais, quase invariavelmente, a sintagmática é de tal modo parcimoniosa que escassos núcleos/funções cardinais transportam o leitor, no espaço de algumas linhas, para um clímax que se esperaria mais tarde. Como consequência dessa técnica de apontamento, a aproximação entre personagens é rápida e desemboca num relacionamento íntimo mais ou menos inconsequente, mas muito gratificante na sua consumação fugaz.
Mas a incomodidade que se sente na leitura destes contos acentua-se ao chegar à segunda parte do livro, isto é, ao conjunto de narrativas intitulado “Angústia com licor de rosas”. Aqui, maugrado o respeito e admiração (não só nos planos profissional e literário, de resto) que nutro pelo meu professor de Literatura Portuguesa de há muitos anos, não resisti… e vai de passar um traço (a lápis) por cima do último parágrafo de quase todos os contos. Supérfluos, esteticamente infelizes, aqueles apêndices conclusivos como que agridem o leitor, ao colocá-lo perante o aviso “Se te deixaste embalar pela magia da minha prosa, acorda; isto não passa dum sonho!”. Que se trata de sonhos (reais ou inventados, pouco importa), sabe-o o leitor; que necessidade de o esclarecer com observações como estas: “É nesse momento que o despertador começa a tocar furiosamente, chamando-ma para mais um dia de trabalho ingrato” (p. 98), ou “Abro então os olhos (…). Porque é que me terei sonhado empregado dos correios?” (p. 101), ou “Acordei deste sonho com lágrimas nos olhos (…)” (p. 103), ou “Quando me ia deitar, nos dias seguintes, tentava voltar a este sonho (…)” (p. 105), ou “Foi nesse momento que caiu ao chão uma garrafa de água (…), acordando-me brutalmente.” (p. 106), etc.?
Como é que um ensaísta de craveira e ficcionista experiente comete o que se me afigura uma óbvia inabilidade?