Três poemetos sempre actuais (em dia de manifestação de reformados)
Entre patrão e operário
Entre patrão e operário,
entre operário e patrão,
o que é extraordinário
é pretender-se união.
Não vista a pele do lobo
quem do lobo a lei enjeita.
A propriedade é um roubo.
Ladrão é quem a aproveita.
Negar a luta de classes
é negar a evidência
de um mundo de duas faces,
de miséria e de opulência.
Armindo Rodrigues
Ana e António
A Ana e o António trabalhavam
na mesma empresa.
Agora foram ambos despedidos.
Lá em casa, o silêncio sentou-se
em todas as cadeiras
em volta da mesa vazia.
“Neo-realismo!” dirão os estetas
para quem ser despedido
é o preço do progresso.
Os estetas, esses, nunca
serão despedidos.
Ou julgam isso, ou julgam isso.
Mário Castrim
De semântica
Recentemente
na fábrica
melhoraram muito
as relações humanas.
Agora, por exemplo,
ao tirar-se o prémio semanal
a uma operária
por uma mistura de fios,
por exemplo, ou por qualquer acto menor de indisciplina,
já não se diz impor um castigo;
diz-se:
estimular o sentido
da responsabilidade.
Miguel Martí i Pol (tradução de Manuel de Seabra)