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Também de esquerda

Espaço destinado a reflexões (geralmente) inspiradas na actualidade e na Literatura.

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Espaço destinado a reflexões (geralmente) inspiradas na actualidade e na Literatura.

O teu rosto será o último, de João Ricardo Pedro

 

Foi a curiosidade quanto à qualidade de um primeiro romance de um jovem escritor desempregado premiado com o Leya 2011 que me levou a comprar O teu rosto será o último e a lê-lo em poucos dias. Depois, aguardei mais uns dias. Talvez se produzisse um processo de decantação, que deixasse à tona apenas umas poucas de ideias, que serviriam de mote para o post. Mas, da decantação, sobrou muito pouco. Tão-só a ideia de que é uma narrativa bem construída e servida por um manejo quase exemplar da língua, restrição que justifico com a ocorrência de dois solecismos irritantes. Lê-se, com efeito, a páginas 80, a seguinte frase: “Um dos [retratos] que constava da pasta IGA (…) tinha a mesma data (…)”. Ora, sendo este que o sujeito de constar, o autor deveria ter escrito: “Um dos [retratos] que constavam (…)”. Na página 170, escreve-se o seguinte: “Um anel (…) que (…) era estranho alguém usá-lo no dedo (…)”. As supressões a que procedi não alteram a estrutura fundamental da frase nem o seu conteúdo, apenas facilitando a sua análise. Não é difícil apreender o carácter redundante do pronome pessoal lo, que está em concorrência com o relativo que, o qual tem por antecedente “um anel”. A frase correcta seria “Um anel (…) que (…) era estranho alguém usar no dedo (…)”.

 

No melhor pano cai a nódoa e quem nunca errou que atire a primeira pedra. O que, pessoalmente, me incomoda um pouco é que a história de João Ricardo Pedro não me arrastou para paragens desconhecidas, não me fez embarcar num comboio mágico de aventura, não me pôs a dar continuidade, por mim mesmo, à história encetada pelo autor, como tantas vezes nos acontece com narrativas aliás não necessariamente da extensão do romance. Para dar apenas dois ou três exemplos, das minhas leituras recentes, isso aconteceu-me com o remorso de baltazar serapião, de valter hugo mãe, e até com Comissão das Lágrimas, de Lobo Antunes, que, no entanto, não aprecio particularmente, ou com algumas histórias de Encontro de amor num país em guerra, de Luís Sepúlveda. Contrariamente ao que vaticinei para o romance de valter hugo mãe, não creio que O teu rosto será o último fique na história da nossa literatura como um grande romance. Em tempo acrescento, porém, que aguardo o segundo romance de João Ricardo Pedro com uma expectativa positiva.