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Também de esquerda

Espaço destinado a reflexões (geralmente) inspiradas na actualidade e na Literatura.

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Espaço destinado a reflexões (geralmente) inspiradas na actualidade e na Literatura.

A SELECÇÃO NACIONAL E AS TVS

O serviço público de TV (RTP1) brindou-me ontem, enquanto almoçava, com 50 minutos ininterruptos de Selecção Nacional. Durante este lapso de tempo, pesquisei todos os outros canais informativos e, em todos eles, as imagens se equivaliam: Selecção Nacional. Depois de cogitar brevemente na hipótese de haver informação sobre os conflitos em curso no mundo ou sobre a actualidade nacional, optei por desligar o aparelho. Almoço concluído, digestão iniciada, não estava disposto a esperar mais. Mas, sem TV, deu-me para reflectir, coisa que me acontece esporadicamente e que não é nada boa para a digestão, mas enfim… E então, eis que comecei por reflectir na importância das Selecções Nacionais, que empolgam milhões de meus semelhantes, em Portugal, e ainda mais milhões de meus semelhantes em tudo menos na nacionalidade, que ele há Selecções Nacionais um pouco por todo o planeta e, quem sabe, noutras galáxias circundantes da Terra, centro do Universo. Quando há Selecções Nacionais, não há conflito, naufrágio, catástrofe natural ou fenómeno meteorológico sobrenatural capaz de obnubilar as câmaras das referidas Selecções Nacionais, sob pena de atentado aos sentimentos patrióticos do povo. Vai daí, também reflecti, malgrado o desespero da digestão posta em lista de espera, que o Futebol é, juntamente com a Senhora de Fátima-Ourém, um mobilizador excepcional das massas.

(Não comece já a disparatar: claro que esta reflexão nada tem de original; há montes de anos que muita gente fala dos três efes; só reflicto em banalidades. Alto lá, que eu ainda não cheguei a meio.)

Ora bem. Agora é que me vou acercar do cerne da questão, o qual é este: há imenso tempo que partidos (uns mais do que outros) e sindicatos se debatem com problemas de mobilização dos cidadãos para defesa disto e daquilo, muitas vezes sem êxito notável. O meu Partido, para usar apenas o exemplo que me é mais querido, só fala de coisas que pouco dizem aos meus semelhantes: ele é o custo da vida, ele são os baixos salários e pensões, enfim, não vou continuar que vocês conhecem a cassette. Ora isto não interessa ao careca. Nem ao cabeludo. Nem ao Miguel Sousa Tavares. A Selecção Nacional, essa sim. Vai daí (como disse já atrás), disse para com os meus botões de punho: eh pá! O D. Duarte Pio, duque de Bragança e herdeiro do trono, não é muito inspirador; logo, a criação de uma Selecção Monárquica não nos levaria longe. Até os pastorinhos de Fátima-Ourém, hoje em dia, já não olham para o céu, nem topam ninguém na copa das alfarrobeiras ou lá que árvore era aquela, que alfarrobeiras é mais cá para baixo; agora, distraem-se com o Tik-tok, vivem naquele eclipse permanente, e aparições... nicles. Claro que milhões de meus semelhantes continuam a fazer a sua peregrinação anual ou, pelo menos, a vergar-se perante a imagem da Senhora, mas este domínio reveste-se de particular delicadeza, pelo que vale mais não insistir. Até porque se pode sempre dizer que a Senhora Tal e Coisa é a minha utopia da nova Idade do Ouro. Aí, eu ia ter de dizer que uma coisa é o Pai Natal, outra coisa é o Joaquim Francisco, e nunca mais se parava.  Quanto ao Fado, um dos efes, evoluiu de tal modo que já não mobiliza como outrora: os marialvas e as desgraçadinhas modernizaram-se, foram à escola; eles adaptaram-se às redes sociais e elas já não sofrem com a traição (dão de frosques e vão ao Kinder, aliás Tinder, acabo de descobrir). Logo… os partidos (exceptuando o PPM, em busca do trono perdido) têm de criar equipas de Futebol próprias, para disputar os campeonatos, as ligas e as taças: Futebol Clube Social-Democrata, Futebol Clube da Esquerda Bloquista, Clube Comunista Português, Liberal Futebol Clube, e assim sucessivamente. Ides ver que o nobre povo vai encher patrioticamente os estádios, ruas e praças desta nação valente e imortal e festejar as vitórias do nosso clube partidário de forma nunca dantes vista. Garantido!

(10/06/2025)