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Também de esquerda

Espaço destinado a reflexões (geralmente) inspiradas na actualidade e na Literatura.

Também de esquerda

Espaço destinado a reflexões (geralmente) inspiradas na actualidade e na Literatura.

TRANSE, de Teresa Villaverde Cabral

 

MDM - 25-11-2024 - Dia Int. pela Eliminação da Violência contra as Mulheres.jpg

Depois de duas decepções, com “Megalópolis” e “Substância”, vi “Transe”, de Teresa Villaverde Cabral, no IPJ de Faro e no dia 25 de Novembro, Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres, uma iniciativa do MDM. Filme duro, incómodo, violento. Como a violência exercida sobre as mulheres.

 

Numa primeira apreciação, estranha-se a imobilidade da câmara e a passividade da protagonista, em numerosas sequências. A lembrar o tempo fílmico de Manoel de Oliveira. Mas a realidade concreta vivida pela jovem trânsfuga – o transe – é de molde a deixar qualquer um(a) interdito/a, expectante, reduzido/a ao silêncio e à paralisação pela angústia, ou seja, o tratamento cinematográfico do tempo pode ter como intenção e como consequência levar o espectador a viver de forma mais intensa a emocionalidade (que palavrão…) da história.

 

Quanto ao fundo da questão – a tal violência, física e, no caso, essencialmente de natureza sexual – a narrativa não nos revela nada que não saibamos, da realidade que nos cerca e da ficção a que temos fácil acesso. Infelizmente. Apetece lembrar Freud, a pulsão de vida, mas também o cérebro trino, e particularmente o reptiliano, com o afloramento ainda tão comum das pulsões e instintos mais primitivos da humanidade. Apetece recuar aos primórdios, à horda primitiva: a supremacia do pai/macho, dominante, impondo o monopólio das fêmeas aos demais, que acabam vingando-se. O que lhes valerá um sentimento de culpa que perdurará pelos séculos vindouros.

 

Contudo… a protagonista emigra porque quer ser rica. O que nos leva a outro tipo de considerações: a alienação, a preterição do ser a favor do ter, a valorização dos bens materiais em excesso e para benefício individual, em detrimento da aspiração à felicidade colectiva. O que não absolve os traficantes de seres humanos, seus abusadores, dos crimes abomináveis que praticam e promovem.

 

Se há lição a tirar, tiraria esta: a humanidade continua numa confrangedora infância, incapaz de controlar as pulsões de um “id” a que a filogénese tarda a chegar, e a cultura integral do indivíduo está ainda longe de ser a muralha de aço contra todas as formas de violência, sejam elas de género ou de classe.